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Desistir

Não vou escrever sobre o que é desistir de fazer uma prova ou entrar numa competição. A competição é tema que pouco me interessa…

Este desistir é um pouco diferente, é aquele que se sente quando a exaustão e o desgaste absoluto nos consome. Quando se vivem situações limites, exigentes, onde temos de estar presentes sempre a 100%  chega o dia em que se torna impossível manter o ritmo ou até continuar a acompanhar neste registo. Num momento qualquer, começamos a ceder. O corpo deixa de conseguir acompanhar o compasso, começamos a fraquejar, deixamos de ter coragem, o cansaço começa a vencer-nos e é natural, não somos super-homens, temos limites e o corpo é uma máquina perfeita que nos dá todos os sinais sobre isso.

Conseguimos aceitar com alguma facilidade esta necessidade de descanso se estivermos a esticar a corda com trabalho, algum projeto em que estivermos envolvidos ou borgas em excesso, não conseguimos fazer o mesmo quando este desgaste se dá quando tomamos conta de alguém de quem gostamos. A doença, o cuidado que o outro precisa continua lá, mas nós não aguentamos mais. Não aguentamos mais vê-los sofrer, não saber o que fazer mais, passar os dias a correr de um lado para o outro a socorre-los, o querer estar presente e não falhar 24/7,  por eles e para nós.

É impossível, sabemos disso e não queremos aceitar. Por muito que nos custe, tentamos manter o ritmo, suportar o insuportável.

O dia chega, como tudo na vida e não aguentamos mais. 

Começamos a adoecer facilmente, a energia falha, a vitalidade desaparece, deixamos de ser boa companhia, deixamos de fazer tudo o que antes fazíamos. Não somos de ferro e por mais que se lute pelos outros, quando começamos a desligar-nos de nós próprios e nem forças temos para a nossa vida, como pudemos lutar pela dos outros?

Quando desistimos, julgamos nós que desistimos apenas porque já não conseguimos mais, na verdade não desistimos sozinhos. O outro também começa a ceder e a deixar-se ir, sente que é o momento para isso porque a nossa força para puxá-lo, para trazê-lo para a vida deixa de lá estar ou perde intensidade. Somos o suporte uns dos outros, a energia é contagiante e não é mentira nenhuma, sente-se.

Não queremos que o outro perca a batalha com a vida. Não queremos deixá-lo ir, por nós, pelo nosso amor, pelo nosso egoísmo, porque não somos capazes… até que a natureza começa a fazer isso por nós, obrigando-nos a ceder, pouco a pouco. Começamos a perceber que nos vamos desapegar a bem ou mal, não estamos a desistir estamos a libertar-nos mutuamente, numa profunda entrega de amor.

Não é fácil aceitar isto, porque como humanamente fazemos a primeira reação é de culpa. Sentimo-nos culpados por termos desistido, mesmo que saibamos que era inevitável.

Não se gosta nada de inevitabilidades, passamos a vida a evitá-las, mas com a morte não temos sorte. Não que ela nos vença, ela chega quando tem de chegar, não importa o quanto se lutou contra ela.

Se alguém estiver a passar por isto, reconforte-se por saber que não tem culpa de nada e que o facto de estar a desistir está a permitir que o sofrimento não se prolongue mais e que só chegou a este ponto, porque tentou tudo o que era possível. Foi enorme!

Do outro lado, quem vai sabe e parte grato por isso, do amor ninguém desiste.
É a energia que fica entre os dois polos, quando se entende isto tudo fica mais fácil.



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