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GRANDEZA*

Um amigo do meu pai, um senhor já com os seus 80 anos avançados, confidencio-me num passeio e almoço (organizado e proposto pelo próprio) que muitas das pessoas que ali se encontravam, só estavam presentes porque ele as informava do convívio e organizava tudo. E que ele fazia questão de telefonar regularmente a grande parte delas mesmo sabendo que muitos não iriam retribuir a gentiliza com a mesma regularidade com que o fazia.

Perguntei-lhe: “Então porque faz isso? As pessoas também têm de ser gentis consigo e telefonar para saber de si.” Ao que ele me respondeu: “É verdade. Mas senão for eu mais ninguém o fará, na verdade tenho gosto de fazer isto e mostrar que me preocupo mesmo que não retribuam. É importante para mim, mesmo que ninguém agradeça ou corresponda, só por esse motivo já vale a pena. Sei que ao fazer o que faço mantenho as pessoas ligadas umas às outras.”

Eu que tantas vezes fiz o mesmo, fiquei a pensar na conversa que oportunamente surgiu naquele momento em que tinha decidido demitir-me de fazer aquele papel, por achar que os outros também deveriam fazê-lo, senão por eles, por amizade comigo.

O mesmo voltou a repetir em conversa com o Vasco.

“Porque envias estas mensagens sempre tão simpáticas? No dia da mulher? Nos aniversários? Na Páscoa? Só com os bons dias? E estás sempre a organizar coisas e a juntar grupos e pessoas diferentes, porquê? Nem todas as pessoas alinham quase de certeza, não?”.

Ao que ele me respondeu sem hesitar e de sorriso no rosto, quase da mesma maneira, que o Sr. Pascoal tinha feito anos antes. “Eu gosto de fazer isto, sei que as pessoas também gostam mesmo que não respondam ou retribuam. Eu sei que algumas pessoas não respondem, outras nunca irão responder mas eu não me importo, não desisto delas. Com algumas pessoas têm de ser assim. Fazer isto, também me faz feliz, sabes? Só por isso já vale pena.”

Hoje passaram 7 anos que o Vasco partiu, relembro esta conversa com alguma frequência para manter a alguma fé na bondade das pessoas. Felizmente existem pessoas com este sentido de amizade e entrega, por outro lado são também a prova que de facto não é para todos! Nem todas as pessoas serão assim ou terão a capacidade de ser e nem todas as pessoas que têm a sorte de ter amigos destes irão reconhecer o seu valor.

Não basta empatia é preciso mais do que isso, é preciso saber ser feliz com “pouco”, ficar feliz pela felicidade do outro porque também é em parte, um porção da nossa felicidade.

Acho esta perspectiva de amizade, do Vasco como do Sr. Pascoal, grandiosa. Eu ainda preciso de alguma reciprocidade para valorizar os laços, e também não tenho o desprendimento necessário para fazer apenas sem receber nada em troca. Pode ser que um dia chegue lá.

*gran·de·za |ê|

nome feminino

1. Qualidade de grandetamanhoextensãoalturacomprimento.

2. [Figurado]  Excelência (em coragemmagnanimidadeetc.).

3. Faustopompaopulência.

4. Nobreza.

5. Dignidadehierarquia.

6. Título honorífico de grande do reino.

7. [Astronomia Grau de intensidade da luz das estrelas.

8. [Matemática Tudo o que é susceptível de ser acrescentado ou diminuído.

9. [Metrologia Propriedade de um corpode um fenómeno ou de uma substância que pode ser expressa quantitativamente por meio de um número e de uma referência (ex.: grandeza de basegrandeza derivadaa velocidade e o volume são grandezas físicas).


"grandeza", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/grandeza [consultado em 05-09-2022].



Comentários

  1. Banda sonora para o post:
    Preoccupations - Unconscious Melody
    https://www.youtube.com/watch?v=EW67v2dVkpM

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  2. Olá Sofia. Entendo tão bem o que contas sobre o Sr. Pascoal e o Vasco. Falta-me dar aquele passo, para fazer as coisas acontecer. :-)
    Bjs

    ResponderEliminar

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