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Um jornal no comboio

A distribuição de jornais gratuitos nos transportes é uma ocorrência banal que acontece todos os dias. É comum ver-se as pessoas entretidas a lê-los no comboio e a depositarem-nos depois disso num banco vago, entalá-los semi disfarçadamente entre bancos ou no chão (sim, também acontece). A forma como as pessoas fazem estas coisas deixa-me perplexa, com uma agravante, não consigo disfarçar. Não consigo entender o que custa levar o jornal até ao caixote do lixo, não é o Expresso!!! É um jornal que tem pouquíssimas páginas.

Hoje testemunhei uma destas cenas, uma senhora que ia uns bancos ao meu lado a ler o jornal, depois de ter acabado pega no jornal e encaixa-o entre as suas costas e as costas do assento. Sim, é verdade!! Ali bem esmagado entre a blusa da senhora e as costas do banco, uma maravilha! Como imaginam fez tudo com muita naturalidade, afinal de contas o jornal estava lido. Arrumou os óculos na caixinha ajeitou-se e ali ficou até sair umas paragens mais à frente.

Quando se levantou o jornal deslizou e ficou meio suspenso entre as costas do banco e a base, obviamente não saiu com a senhora. As pessoas que estavam de pé hesitaram, estava ali um lugar vago mas com um jornal a ocupá-lo. Uma destemida passageira agarrou nos tarecos e sem medos sentou-se no lugar, e sentou-se como? perguntam vocês. Sentou-se em cima do jornal, nem o desviou, para quê? E porquê?

A conclusão que chego é que as pessoas reclamam da falta de cuidado e limpeza dos sítios, da poluição, do que as empresas, instituições ou o estado não fazem e falham no básico. Estão-se a borrifar, alguém vai limpar, alguém vai pegar no jornal e ler e dá-se continuidade. As pessoas estão em estado vegetativo, vivem como se estivessem ligadas a uma máquina de suporte de vida e pouco mais. Não pensam com qualidade, não sentem com qualidade, não reagem com qualidade, não vivem com qualidade.

Numa situação tão simples e básica como esta, ler o jornal no comboio, levá-lo connosco e deitá-lo fora no caixote do lixo parece um procedimento difícil de cumprir para algumas pessoas e a senhora que se sentou em cima do jornal achou normal sentar-se sem tirar o jornal? Não era dela, não quis saber. Não existe hipótese de não ter visto, não tenho uma palavra que qualifique o comportamento, talvez seja desleixo ou estar apática, não sei.

As pessoas vivem inanimadas sem darem conta. Querem um mundo melhor e não se esforçam por mantê-lo limpo e cuidado, exigem mas não estão dispostos a fazer nada por isso. E falham logo nas questões mais simples, aquelas que desvalorizam, porque só as grandes ações são dignas de nota! Não é verdade, temos de começar pelo principio e não pelo fim e com aquilo que está ao nosso alcance. Desvalorizamos a nossa existência quando falhamos nestas coisas, quando achamos que não devemos dar o exemplo em pequenas coisas porque não são visíveis, não estamos só falhar com o mundo e com a sociedade de um modo geral, estamos a falhar connosco e com a nossa missão neste mundo.

“Less is more” como se diz em inglês… e parece que as pessoas só conseguem ver o que é grande, gigantesco! E por isso demitem-se dos pequenos bons exemplos que podem dar e isso é triste.


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