Uma casa vazia

Do lado de fora da porta, tudo igual. O mesmo tapete encostado no lancil da entrada, a porta maciça firme e sólida como sempre. Do outro lado um inexplicável vazio.

Como é difícil entrar num dos espaços mais preenchidos da nossa memória, que agora se encontra vazio. São coisas, são objetos, a matéria, a pessoa que lá vivia não existe, por isso não faz sentido manter. Não nos pertence, nada do que ali está é nosso.

É um ato de coragem, entrar. E entra-se. Entrei. Os espaços parecem incrivelmente mais pequenos, não devia ser o inverso? Ou é porque a alma mirrou no vazio? Ou é pelo eco das paredes? Não sei. Parece-me tudo muito mais pequeno, agora que o espaço está vazio, e antes atafulhado de tralha. Não sobrou nada, nem luz. Sobrou apenas o que não se conseguiu arrancar das paredes. Ainda se sente o cheiro da vida que ali vivemos, mas pouco. Nada daquilo faz sentido.

Destemida e brava guerreira, é assim que eu acho que sou, mas não ali. Não naquelas circunstâncias. Caiu-me em cima a devastação de um tsunami. Nada nos prepara para isto. Morrer é natural, faz parte da vida, o vazio não. Este vazio em que se desmoronam as memórias e uma parte de nós, não. É uma sensação avassaladora de impotência. Como fomos capazes? É como se desonrássemos uma parte de nós próprios, escondêssemos o lixo de baixo do tapete.

Tinha de ser. É mesmo assim a vida. Não perdemos o que já vivemos. Mas choramos na mesma, com dor, saudade e impotência. É duro. Custa muito. 

Sabemos que isto é a vida, ainda assim ficamos tão vazios como a casa.  


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