Tenho alguma dificuldade em conseguir articular verbalmente
tudo o que consigo escrever. Quando escrevo, oriento as ideias, elimino partes,
mudo os sentidos, consigo encadear as palavras de forma lógica e orientada. Fazem
sentido assim, querem dizer isto assim ou mais. O que é claro fica mais claro,
os subentendidos mais sofisticados. Posso refletir, corrigir, reescrever,
apagar tudo, voltar ao inicio. Escolho o tom que quero e como quero. Exponho
mais ou menos consoante a minha vontade. Digo tudo e não digo nada. Quando escrevo
o raciocino flui, não se sobrepõem como nas conversas. Dá espaço para que diga
o que gostaria de dizer, bonito, feio, forte ou fraco.
O tom da minha voz
atrapalha-me, o som das palavras mistura os contextos, já não sei o que quero
dizer com principio, meio e fim. Nunca digo tudo ou digo mal, ou esqueço de
metade. Não domino esta arte, o bom discurso tem de ser escrito primeiro. Ou bem
treinado. Ou temos de ter o completo conhecimento do tema de que se fala: a
preparação.
Posso treinar uma vida inteira de conversas imaginárias.
Quando isto acontecer, vou dizer isto. Não digo, depois atrapalho-me. Deixo-me
ir. Acredito nalguma coisa que não estava à espera, oiço o que quero. Metade
fica por dizer, mesmo depois de tantos ensaios.
No papel fica tudo na cadência que se pretende. Nem mais nem
menos. Fica registado na ordem certa, as palavras todas, o contexto alinhado
pela história que se projeta e que no papel se conta do principio ao fim na
ordem temporal certa. Penso mais rápido do que falo, penso mais rápido do que
escrevo: quando falo perco informação e muitas das palavras ficam entaladas na
garganta, presas. Quando escrevo quase nada me escapa.
Comentários
Enviar um comentário