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Tempos verbais


Falamos dos mortos como se estivessem vivos e dos vivos como se estivessem mortos.
O queria, quero, quis sem saber na realidade em que tempo e espaço os devemos utilizar. Querias, já não queres? O quis que afinal é quero.

O falar no passado quando se quer só o presente e um futuro garantido. Não saber qual o tempo certo, por estarmos algures na terra de ninguém, num vazio temporal sem ordem ou cronologia.

É falar do passado como se fosse presente, como se estivéssemos a viver o que foi e não o que é. O passado não se constrói, está feito é um momento terminado, sem hipótese de correção ou emenda. Mas insistimos em transportar-nos para lá, como se essa viagem imaginária pudesse alterar alguma coisa.

Os que morrem, não desaparecem continuam no presente como se estivesse ao nosso alcance falar com eles. E são, estão, vivem como se o tempo não tivesse terminado no dia em que fecharam os olhos para sempre, mais vivos que outros vivos.

Os vivos que existem e respiram o mesmo ar que nós, mas que se ausentam por tempo indeterminado ou para sempre. Nunca mais os vemos, mas sabemos que vivem como nós noutra realidade paralela que não se cruza com a nossa. Houve um momento qualquer, em que as realidades se cruzaram por instantes ou por períodos de tempo mais longos, e um dia evaporam-se para nunca mais voltarem.  

Os tempos verbais baralham-se na linha temporal em que vivemos, como as distâncias que parecem curtas. Não existem oceanos ou continentes que nos consigam distanciar, quando o que se sente é forte. O silêncio que se prolonga sem doer.

Passado, presente e futuro descontextualizam-se e misturam-se. O que queremos, o que desejamos, o que vivemos parecem pertencer a parcelas de tempo diferentes sem nunca se cruzarem. Vivo hoje a pensar no amanhã, com saudades de ontem. Não! Vivo hoje e só hoje.
Quero no presente, como quis no passado, como acho que vou querer no futuro, não sei. Hoje sei que sim, quero. Um quero com continuidade, como um tempo verbal que se prolonga por dias sem fim.



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